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Lavandaria

por Jorge Fiel

Lavandaria

por Jorge Fiel

Sex | 29.05.09

Uma pessoa tem de estar preparada para tudo na vida - até para aprender com o Paulo Coelho!

Jorge Fiel

O Pepe Carvalho habitará para todo o sempre na minha galeria de heróis.

Invejo-lhe os dotes culinários, que o habilitam a cozinhar um afamado e invejado bacalau pil-pil.

Foi por directa influência deste detective catalão, nascido da prodigiosa imaginação de Manuel Vasquez Montalban, que me tornei fanático de triângulos de manchego empurrado por copos de Paternina.

Só dois dos hábitos de Pepe Carvalho (em ex-comunista que se tornou agente da CIA) me inspiram alguma relutância – a escandalosa relação que mantém com a sua amiga Charo (que, digamos, faz do sexo a sua profissão) e o vício de usar livros para atear a sua lareira.

Como não tenho fogão de sala na minha casa nova, não corro o risco que queimar os livros. Mas estou a pensar seriamente em desfazer-me deles.

Curiosamente, foi o Paulo Coelho, que já vendeu mais de 500 milhões de livros (ele há gente para tudo!), é uma das pessoas que mais me está a encorajar para me desfazer da maioria dos livros.

Noutro dia, em conversa com o Fernando Morais (o biógrafo do Paulo), soube que o autor do Alquimista nunca guarda mais do que 200 livros em casa. Se compra dois livros novos, desfaz-se logo de dois livros velhos. “Os livros têm de viajar”, explica.

Dito isto, estou a um passo de me tornar um militante do book crossing.

Quem sabe se amanhã vou deixar o Sexus, do Henry Miller, no McDonalds da avenida da Boavista, o Portugal e a Guerra Civil de Espanha, da Iva Delgado, no café Vaga, o Apenas um Olhar, do Harlan Coben, num banco do autocarro 503  e o Merde, de Stephen Clarke, numa mesa da Casa das Sandes do Península?

Qui | 28.05.09

E se eu deitasse fora 4/5 desta tralha?

Jorge Fiel

A mais completa das desarrumações. Esta é a legenda mais benigna para o estado actual do meu escritório.

O caos é tal que, apesar de ser geneticamente desavergonhado, pensei três vezes antes de me decidir a partilha convosco uma imagem desta catástrofe – e, confesso, me inibi de mostrar o seu lado pior.

Tudo por causa dos livros e da minha mania em arquivar compulsivamente recortes de jornais e revistas.

Não ouso sequer avançar com a previsão de uma data para estar tudo arrumado ao ponto de eu conseguir achar, num prazo máximo de 15 minutos, as pastas sobre Energias Renováveis ou a vida do Manuel Violas, um artigo do El Pais sobre as melhores pastelarias de Budapeste ou o dossier sobre os hábitos sexuais dos portugueses publicado na saudosa e falecida Revista do Expresso.

Os livros, esses estão amontoados sem o mínimo critério, A Sociedade do Espectáculo, de Guy Debord, Sara, de Olga Gonçalves, e Tensões Sociais em Portugal na Idade Média, de Humberto Baquero Moreno, convivem alegre e anarquicamente na mesma prateleira.

O caos é tal, o pó é tanto, que dou por mim a trabalhar em esplanadas ventosas daquilo que tem todas as condições para ser uma acolhedor e confortável escritório.

O drama é tal que às vezes dá-me ganas de deitar 4/5 (pelo menos!) desta tralha que me rodeia!

Qua | 27.05.09

Quero informar-vos que entrei num período de reflexão sobre o sentido que faz coleccionar livros

Jorge Fiel

Mantendo-me no tema dos livros, mas saltando para o depois, entrei num período de séria reflexão sobre o sentido que faz coleccionar livros.

Li três vezes O que diz Molero, do Dinis Machado, e sou capaz de reler todos os livros da série Wilt, do Tom Sharpe.

Dá sempre muito jeito ter à mão o Dicionário de Língua Portuguesa da Porto Editora.

A História de Portugal dirigida pelo Mattoso fica bem em qualquer estante se bem que, manifestamente, não tenha sido desenhada para ser ma obra de consulta.

O Google Maps funciona muito bem, mas não dispensa um (ou até mesmo vários) bom e velho Atlas, em papel.

A Wikipedia é fácil e rápida de consultar, mas não é por isso que me vou desfazer das bonitas lombadas vermelhas dos 24 volumes da Enciclopédia Ilustrada Larrouse.

Até aqui tudo bem. Mas será que alguma vez vou reler a Introdução ao marxismo, de Ernest Mandel (edições Antidoto), os Cravos de Varsóvia, de Michel Germont (Edição Europa-América), ou o Vagabundo Filósofo, de Maximo Gorki (Edição Civilização)?

Qual será o sentido de andar a transportar estas relíquias às costas?

Ter | 26.05.09

A livralhada foi o nó do problema

Jorge Fiel

 

Não tenho a mínima em dúvida em identificar a livralhada como o nó do problema da minha mudança.

A cultura pesa imenso e esse foi o ponto nevrálgico dos trabalhos da minha transferência do código postal 4150-596 para o 4100-115.

Os livros são muito exigentes. Há drama pela proa se enchermos até cima com livros um caixote grande da Renova, dimensionado para transportar uma carga mais leve – se bem que não menos sensível. No mínimo, a caixa rebenta. No máximo, vai despertar a tormentosa e adormecida ciática.

O saber de experiência feito diz-me que os livros devem ser acondicionados em caixas pequenas, o que contribui directamente para fazer com que a operação de mudança seja mais cara e morosa.

Mais cara, porque obriga à aquisição de caixas especializadas. Mais morosa, porque multiplica o número de operações de montar a caixa, fechá-la e selá-la com fita, transportá-la, voltar a abri-la com a ajuda de um canivete suíço, aliviá-la do seu conteúdo, desfazê-la e levar os seus restos mortais ao contentor azul destinado ao papel e cartão. Uma canseira!

Seg | 25.05.09

Prolegómeno à problemática das caixas de cartão

Jorge Fiel

A problemática das caixas de cartão canelado é muito mais complicada do que aparenta ser.

Nos preliminares para a mudança, comecei a reunir caixas, oriundas de diferentes proveniências, a saber:

a)     Caixotes dos Urbanos (que, a levar em conta a tabela de preços que praticam, devem ser o Rolls Royce das mudanças no nosso país) sobrantes da mudança o escritório do Porto do Expresso da rua Júlio Dinis para o Monte dos Burgos;

 

b)    Caixotes gentilmente cedidos pelo gerente do Pingo Doce da Pasteleira (olá Luís Palha, se por acaso estiver a ler isto faça-me o favorzinho de promover o rapaz, que tudo leva a crer ser uma jóia de um moço);

 

c)     Caixotes que tinha guardado (não sei se já vos disse, mas tenho uma enorme dificuldade em me desfazer das coisas) das três vezes que este século me vi obrigado a ir trabalhar para Lisboa (dois anos a editar a Revista do Expresso, três anos a editar a Economia do Expresso, e sete meses no Diário de Notícias).

Pois a triste e dura realidade que tenho aqui para vos confessar é que esta acumulação primitiva de caixotes se revelou claramente insuficiente para fazer face às necessidades e me obrigou a ir ao Staples comprar caixas de cartão no valor comercial de cem euros.

Sex | 22.05.09

É preferível ver o Bom Dia Portugal, do princípio ao fim (intervalos incluidos), do que encher caixotes

Jorge Fiel

Em tudo na vida há um antes, um durante e um depois. As mudanças de casa não escapam a esta regra.

Antes da mudança de casa ,a palavra de ordem é empacotar, uma actividade que, ao início, até pode parecer divertida, mas que a partir da primeira hora começa a revelar-se perigosamente insane, alienante e cara.

Na sua imensa sabedoria, o povo diz que o que é demais é moléstia  - e este aforismo está tão carregadinho de razão que desconfio seriamente que quem o formulou morreu vitimado por uma hérnia.

Por muito que uma pessoa ame francesinhas especiais com molho picante, acompanhadas de canecas de cerveja Super Bock bem tiradas, lá chegará a altura - algures entre a terceira e a 28º francesinha e caneca de cerveja consecutivas – em que nós já não podemos ver mais francesinhas à frente.

Por muito que uma pessoa adore ver jogos de futebol na televisão, lá chegará a altura –algures entre o sexto e o 30º desafio consecutivo – em que o que nós queremos é desligar a televisão e reler A Revolução Traída, do camarada Trotsky,  com o lápis em punho para sublinhar as partes mais importantes e comentar as passagens mais polémicas.

Por muito que uma pessoa seja doida por dar cambalhotas, lá chegará a altura – algures entre a nona e a 32ª cambalhota consecutivas – em que nós não queremos mais sexo, mas apenas que nos deixem em paz a dormir.

Para mim, o prazer de montar caixotes de papelão, enchê-los com livros, CDs e DVDs, revesti-los com aquela fita cola larga e castanha, e identificar com um marcador o conteúdo da embalagem e o presumível local de destino, esgotou-se ao fim de sete caixas – faltavam ainda 274, como mais tarde vim a constatar.

Se eu fosse ao George W. Bush, antes de sair da Casa Branca tinha submetido os presos de Guantanamo à terrível tortura de empacotar as coisas dele, afim de serem transferidas no Air Force One para o seu rancho no Texas.

Empacotar é uma temível tortura que recomendo a todos desejem ao vosso pior inimigo. Acho preferível ver o Bom Dia Portugal, do princípio ao fim (intervalos incluídos) do que passar esse tempo a fazer encher caixas de cartão canelado.

Qui | 21.05.09

A primeira das muitas reflexões suscitadas pela minha mudança para o código postal 4100-115

Jorge Fiel

Começo aos poucos a recompor-me da experiência traumatizante que constituiu a minha mudança de residência - do código postal 4150-596 para o 4100-115 - que ocorreu entre as 9h00 do dia 30 de Abril e às 2h30 da manhã do dia 1 de Maio.

Vinte dias volvidos sobre essa data de fraca memória, ainda não sei onde param metade das minhas coisas e no escritório os livros estão espalhados sem critério pelas estantes e montes construídos no chão que não raro derrubo quando tenho de abrir caminho entre a porta de entrada e a cadeira de jardim onde estou provisoriamente alojado, enquanto o estofador não devolve o trono onde habitualmente me sento quando estou ao computador.

Vou tentar regressar ao ritmo diário de postagem, no regime de semana à inglesa (ou seja descanso absoluto ao sábado e domingo) mas não garanto nada.

A única coisa que me sinto em condições de garantir é que ocuparei os tempos mais próximos a discorrer sobre as peripécias da mudança e a proceder a um inventário casual e despreocupado de algumas relíquias que redescobri e que inspiram a primeira das minhas reflexões sobre a mudança de casa, que tentarei formular na observância do rigor cientifico de antepassados como Lavoisier.

Lavoisier disse que na Natureza nada se perde, nada se cria, tudo se transforma.

Jorge Fiel (adoro referir-me a mim próprio na terceira pessoa, como fazem os futebolistas) diz que numa mudança de casa se perde o rasto a muitas coisas (na maior parte dos casos objectos de primeira necessidade, como as pastilhas para a tensão arterial), redescobrem-se outras (na maior parte dos casos inutilidades, como os meus passes do STCP de 1976 e de 1979) e partem-se metade das peças de artesanato em que temos mais estima (como, por exemplo, O Amor é Cego, das manas Flores de Estremoz).