Prefiro o mar salgado a uma piscina cheia de cloro e bifes
A Romy Schneider e o Alain Delon que me perdoem, mas sinto-me muito melhor no mar salgado, com o corpo mais leve a ser embalado pelas ondas, do que numa piscina cheia de cloro e bifes.
A minha rotina de férias de praia, habitualmente preenchida com 15 dias no Zavial (perto de Sagres, lado selvagem do Algarve), foi este ano acrescentada de uma prótese.
Por um daqueles acasos em que a vida é fértil, estou a passar uma semana supranumerária de férias de Verão num aldeamento junto à praia de Santa Eulália, no coração do Algarve bife.
«Sabes, estamos no Algarve! E temos piscina. Várias piscinas». Este primeiro parágrafo do «report» telefónico que o meu filho João, sete anos ainda frescos, fez, ontem à noite, à sua irmã Mariana, revela a dimensão do alvoroço que a novidade piscina desperta na pequenada.
Eu não me queixo. Na idade deles também era assim. A primeira piscina que me fascinou foi a de uma elegante moradia
Foi um dia à noite, junto a esta piscina, que me foi dado a ver um dos mais belos movimentos eróticos que presenciei em toda a minha vida. Alain Delon abraça por detrás Romy Schneider, enfiando ternamente as mãos por dentro do vestido para lhe acariciar as mamas. (La Piscine, um filme de Jacques Deray,
As piscinas também me atraíram muito, não só nos filmes, como também na vida real.
Fartei-me de fazer piscinas (cada treino diário importava em média uns bons três a quatro quilómetros) nas Antas.
Durante os três primeiros anos de adolescente fui um mais do que medíocre (só por um excesso de auto-indulgência me abstenho de me classificar como mau) atleta da natação do FCPorto, uma secção á época dirigida por um engenheiro chamado Belmiro e que trabalhava no grupo do presidente do clube, o banqueiro Afonso Pinto de Magalhães.
Já adulto, um dos meus ideais de felicidade contemplava ter uma casa com piscina. O momento perfeito com que sonhava era completar dentro de água o acordar estremunhado iniciado na cama.
Adoro nadar. Deixar-me afundar na água e depois voltar à superfície usando apenas alguns movimentos de corpo continua a ser um enorme prazer para mim.
(Um discípulo do Freud muito provavelmente identificará neste prazer as saudades dos nove meses passados dentro da barriga da minha mãe, um tempo feliz, despojado de responsabilidades.)
E o acordar é um dos melhores momentos do dia. Além de ser sempre um bom sinal. Temos de convir que não acordar é muito pior.
Há outros acordares felizes para além do despertar na água. Pessoalmente dá-me bastante prazer começar a fazer amor ainda a dormir e acordar a meio do acto.
Mas deixando a queca e voltando à piscina (duas coisas que continuo a achar incompatíveis, apesar de saber que esta minha posição é minoritária), prefiro mil vezes o salgado do mar ao cloro da piscina.
No mar, sentimos o corpo mais leve e embalado pelas ondas - e a densidade populacional é por norma bastante inferior à registada nas piscinas.
Não sou fundamentalista neste debate mar versus piscina. Reconheço que pode ser muito bom complementar uma tarde de praia com umas duas horas de estágio, numa daquelas cadeiras espreguiçadeiras, nas bordas de uma piscina, pontuadas por um mergulho, sempre que acabamos mais um capítulo do thriller que estamos a ler (o que tenho em uso é o The Mark of the Assassin, do Daniel Silva).
Mas reformulei um dos meus antigos ideais de felicidade. Dantes sonhava em ter uma casa com piscina igual aquela em que o Alain Delon acariciou as mamas da Romy Schneider.
Agora, se fosse rico, o que eu gostaria mesmo de ter era uma daquelas belas e espaçosas casas de madeira, como se vêem nos filmes, a dar para o areal, que me permitisse acordar e mergulhar no mar, após uma breve corrida na areia.
PS. Para a contabilidade final desta matéria, declaro considerar que a ausência de areia nas piscinas é, ao mesmo tempo, um ponto a favor e um ponto contra da piscina.
E reconheço que a piscina desfruta da vantagem de ter a água aquecida a uma temperatura mais agradável do que a do mar.