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Lavandaria

por Jorge Fiel

Lavandaria

por Jorge Fiel

Qui | 05.07.07

O Darth Vader roubou-me o passaporte em frente ao Teatro Chinês, em LA

Jorge Fiel

Aspecto do Teatro Chinês, em Hollywood Boulevard

 

Não me posso considerar um Gastão. O meu primeiro dia livre na Califórnia ficará todo sempre marcado pelo roubo do passaporte. Fui vítima do lado escuro da Força. De resto, conheci a a agente Juarez do LAPD, fui ver letreiro de Hollywood, andei pela Sunset Boulevard, comprei quatro CDs usados na Ameoba, espreitei o Rodeo Drive, passeei em Melrose, jantei japonês e falhei o fogo de artifício do 4 de Julho.

 

 

4 de Julho 2007 4ª feira

Los Angeles

 

É uma enorme maçada. E começo a desconfiar seriamente que me estou a transformar numa vítima. O que não é nada bom.

 

Há pouco mais de um mês, o Fisco bloqueou-me as contas bancárias (o plural é usado apenas para conferir um extra de dramatismo à frase, pois na verdade só tenho uma conta bancária) durante uma semana por causa de uma insignificante e duvidoso dívida de IMI.

 

A minha empedrada vesícula agarra-se desesperadamente à vida,  revelando-se uma feroz sobrevivente.

 

Ontem, o pessoal que maneja as malas nos aeroportos de Filadélfia e/ou LA deu cabo dos fechos da minha Samsonite.

 

Hoje, alguém, presumivelmente um carteirista disfarçado de Darth Vader, roubou-me o passaporte na confusão de turistas em frente ao Teatro Chinês, em Hollywood Boulevard.

 

O infausto acontecimento deve ter ocorrido entre o meio dia e uma hora, quando eu me afadigava a fotografar as inscrições, autógrafos e marcas das mãos que actores famosos (como Judy Garland ou Humphrey Bogart) deixaram gravadas no cimento, em frente ao célebre Teatro Chinês.

 

Só dei pela falta do passaporte um pouco mais adiante, depois de investir uns 70 dólares em «tacky» (foleiros) «souvenirs» - T-shirts, magnetos para o frigorifico, postais, porta-chaves, etc – numa loja de recordações.

 

Estranhei que estivesse aberto o fecho eclair do bolso exterior do meu saco de ombro Aldo, de couro preto. Senti um calafrio quando meti lá dentro a mão e só senti os papéis do e-ticket, seguro de viagem e plano de voo. O passaporte tinha desaparecido.

 

Recapitulando os acontecimentos, estou convencido que o roubo se deu na enorme confusão de turistas que se aglomeram em frente ao Teatro Chinês.

 

O Tom, que amanhã ascende à categoria de meu genro, está convencido que o autor do roubo pode ter sido um tipo vestido com um fato de Darth Vader. Também andavam por lá o Shrek, o Rato Mickey e outro pessoal da corda, todos vestidos a rigor. Aparentemente, alguns destes pândegos  arredondam os dólares ganhos posando para fotografias com os turistas, aliviando-os de alguns dos seus bens.

 

No meu caso, o carteirista deve ter sido enganado pela textura do passaporte. Deve-o ter subtraído convencido que se tratava de uma carteira. É a única explicação que arranjo, pois acho que o meu passaporte digital não lhe vai servir para absolutamente nada. Penso que é impossível de falsificar, pelo que é desprovido de valor comercial.

 

Como aqui hoje é feriado (o 4 de Julho celebra a independência dos EUA), o único movimento que pude fazer foi reportar a ocorrência numa esquadra da LAPD, onde fui recebido por uma bonita polícia chamada Juarez, que tomou conta da queixa, não sem me fazer perguntas estranhas (quis saber quanto eu media e pesava, mas o interesse no meu físico desajeitado não era pessoal, já que estas informações ficaram registadas na queixa) e declarar que achava «very funny» a grafia da palavra «portuguese» (ainda estou para perceber porquê, mas a moça divertiu-se à brava com isso).

 

Só vos digo que ficar sem passaporte e sentir-se um incauto é uma grande chatice que me estragou um dia começado com uma expedição até ao mais perto que se pode chegar do famoso letreiro com as letras Hollywood a branco – têm 13 metros de altura cada uma, primitivamente foram lá colocadas como promoção a um empreendimento imobiliário (Hollywoodland) e o H serviu de cenário ao patético suicídio de uma candidata a actriz aborrecida de morte pelo facto de não conseguir deixar de ser candidata.

 

Ao volante do seu Honda (sim, ele tem um carro japonês) o Tom andou disfarçado de guia turístico, mostrando aos futuros sogros algumas das casas mais bonitas de Hollywood, Melrose e Beverley Hills - Rodeo Drive incluído.

 

Fizemos diversas escalas. A fatídica em Hollywood Blvd, junto ao Teatro Chinês, mas também na Amoeba, em Sunset Blvd, que é provavelmente a maior loja de venda de CD, DVD, posters, etc, em primeira e segunda mão.

Para vosso governo, deixo aqui registada a minha lista de compras de CD (todos usados):

 

I’m with stupid, Aimee Mann, USD 6.99

The very best of Lisa Loeb, Lisa Loeb, USD 7.99

Pictures at an Exhibition, Emerson, Lake and Palmer, USD 7.99

All Things Must Pass, George Harrison, USD 16.99

 

Passamos o fim de tarde, em casa da Mariana e do Tom, em Silverlake (com vista para o enorme reservatório de água que dá o nome à localidade), a fazer um bocado de sala com a Beatrice e o Robert (a mãe e o irmão do Tom, que chegaram hoje de New Orleans onde vivem) enquanto bebíamos um Merlot californiano e petiscávamos cubos de provolone e feta.

 

Antes do jantar tardio no Octopus, um excelente japonês em Burbank (a localidade de onde a CBS transmite o Tonight Show with Jay Leno), ainda dormi um par de horas.

 

Devia ter tomado Viagar para prevenir os efeitos nefastos do jet lag  - na Califórnia são menos oito horas que em Portugal.

 

(isto do Viagra é uma espécie de «private joke», a evocação de um assunto debatido há algumas semanas atrás na lavandaria, em cima da notícia de que ratos a quem tinha sido administrado Viagra recuperavam melhor do jet lag do que os outros). 

 

Como o tempo está excessivamente seco, as autoridades proibiram o lançamento de fogo de artifício em Burbank, com medo dos incêndios. Falhei, por isso, os «fire works» que habitualmente sublinham o 4 de Julho.

 

Amanhã é um dia importante. A Mariana casa-se e eu vou iniciar a minha tentativa de arranjar um documento que me permite regressar a Portugal.

 

 

O que John Wayne escreveu no cimento