O “coitus interruptus” do toque de clarim do infeliz corneteiro que salvou Cracóvia dos tártaros
Nunca compreendi a ditadura estética que nos impõe o uso simultâneo de peúgas da mesma cor.
Acolhi bem a ousadia rebelde das mulheres usarem um brinco de cada nação (ou até mesmo a prática do brinco solitário!) de que Margarida Pinto Correia foi um dos arautos á época em que apresentava telejornais na RTP.
Não escondo que acho bastante erótica a visão de um par de mamas em que uma é maior e/ou mais descaída do que a outra.
Por isso, agradou-me logo ao primeiro olhar a Basílica de Santa Maria, em Cracóvia, com as suas torres completamente assimétricas, uma mais alta (81 metros) do que a outra (69 metros) - e com soluções decorativas distintas para o seu remate.
Símbolo maior da arquitectura polaca, a imponente Bazylika Mariacka (Basílica de Santa Maria) pontifica a um dos cantos da deslumbrante Rinek Glowny (praça central), sendo que a sua influência ultrapassa o limitado alcance do sentido vista, prolongando-se no sentido audição – que diariamente, ao meio dia em ponto, é amplificado pela Rádio Nacional para todo o território polaco.
Passo a explicar. Tudo leva a crer que no já longínquo ano de 1241 Cracóvia foi poupada a uma invasão dos tártaros (praga que chegou aos nossos dias mas com os seus efeitos perniciosos circunscritos à dentição) pelos sentidos bem despertos de um bombeiro, providencialmente apetrechado com um clarim.
O bombeiro, medieval e patriota, entrou para a História da Polónia e no quotidiano dos polacos por estar acordado, ver bem ao longe e ser senhor de um apreciável fôlego.
Mal descortinou as hordas tártaras, na linha do horizonte, o bombeiro desatou a soprar no clarim, acordando a cidade a tempo de ela se defender do invasor.
Este episódio acabou em bem para Cracóvia, que rechaçou o invasor, mas mal, mesmo muito mal, para o corneteiro, cujo toque e vida foram tragicamente interrompidos quando uma certeira flecha tártara lhe trespassou o pescoço.
Em homenagem a está espécie de “coitus interruptus” do heróico corneteiro, a passagem das 24 horas do dia é assinalada por um toque de clarim (interrompido, como é bom de ver) executado na janela da mais alta das torres da Basílica de Santa Maria.
Sendo que ao meio dia, o toque interrompido de corneta é transmitido pelas ondas do éter para toda a Polónia, via Rádio Nacional.
(continua)